A pessoa como objecto de prova em processo penal: exames, perícias e perfis de ADN - reflexões à luz da dignidade humana.

dc.contributor.advisorSilva, Germano Marques da, orientador científico
dc.contributor.authorGuimarães, Ana Paula
dc.date.accessioned2015-03-17T10:48:09Z
dc.date.available2015-03-17T10:48:09Z
dc.date.embargo2019-10-31
dc.date.issued2014-09
dc.descriptionTese de Doutoramento em Direitopt
dc.description.abstractA administração da justiça criminal compete ao Estado que, através das diversas fases processuais e por intermédio dos órgãos competentes, investiga, acusa, julga e sanciona. A garantia da segurança da população é uma das tarefas de que o Estado está incumbido por via constitucional, nos termos do disposto no art. 9º, al. b). A força vinculante da Constituição da República Portuguesa impõe ao Estado essa função. Cabe ao Estado a tarefa de reunir os elementos de prova suficientes para atingir a finalidade última do processo penal. Na prossecução deste escopo, e de modo não menos importante, cabe-lhe também assegurar os direitos do arguido. Se por um lado, o Estado tem de lutar contra o crime e realizar as diligências necessárias e adequadas a manter a segurança comunitária, por outro, tem de respeitar e assegurar os direitos do cidadão enquanto objecto da acção punitiva. A administração da justiça penal encerra dificuldades emergentes desta inevitável dicotomia: a defesa eficiente do interesse comunitário e a protecção do cidadão enquanto vítima da acção criminosa e a preservação dos interesses individuais dos cidadãos sujeitos a investigação criminal. Como poderá o Estado, no âmbito da prova em processo penal, percorrer estes dois caminhos sem ofender nenhum deles? Será possível que para a plena e enérgica prossecução da finalidade punitiva se utilizem elementos de prova baseados em métodos científicos tidos como infalíveis que implicam a utilização do corpo humano? Pode o processo penal, em nome da ambicionada segurança da população, obter elementos probatórios no corpo e com o corpo do cidadão? Estas foram algumas das questões a que procurámos responder. No exercício da acção penal o Estado vê-se confrontado com as necessidades de protecção da comunidade só podendo responder na medida da sua capacidade por forma a resguardar a “condição humana” do arguido e os seus direitos jusfundamentais. É esta consonância de interesses conflituantes que resulta dos nºs 2 e 3 do art. 18º da Constituição da República Portuguesa. Havendo trânsito de partículas entre as pessoas, objectos e lugares onde aquelas permanecem ou passam é de particular importância o exame do local do crime para a descoberta da verdade. Partindo desta ideia, Edmond Locard formulou e defendeu o princípio segundo o qual “todo o contacto deixa rasto”. O arguido goza do princípio da presunção de inocência ― art. 32º, nº 2 da CRP ― até ao trânsito em julgado da sentença condenatória. Ao arguido aproveita ainda a inexistência de ónus da prova, o privilégio de não auto-incriminação, o direito de não responder a perguntas feitas sobre os factos que lhe são imputados e o direito de não prestar juramento. Todavia, no encalço da verdade, a lei processual penal impõe-lhe a obrigação de sujeição a diligências de prova especificadas na lei e ordenadas e efectuadas por entidade competente ― art. 61º, nº 3, al. d) do CPP ― e, nomeadamente, a imposição da realização forçada de exames de ADN ― art. 172º, nº 1 do CPP ―, em todas as fases do processo. Estas diligências de prova traduzem-se no dever de o arguido suportar uma actividade probatória, por imposição legal, em que o seu corpo é objecto (v.g. exames e perícias). A Lei nº 5/2008, de 12 de Fevereiro, estabelece os princípios da criação e manutenção de uma base de dados de perfis de ADN com finalidades de identificação civil e de investigação criminal. No que respeita à investigação criminal visa essencialmente proceder à comparação de perfis de ADN entre as amostras de material biológico recolhido nos locais da prática dos crimes com as dos indivíduos que possam estar com eles relacionados, por via directa ou indirecta, e entre os perfis existentes na respectiva base de dados. O uso da cientificidade de meios de obtenção de prova e de meios de prova em processo penal relativos aos vestígios de ADN é cada vez mais frequente, quer nos países da União Europeia, quer fora dela, e é empregado com finalidades de combate à criminalidade, de celeridade e de eficácia na investigação com vista à descoberta da verdade. Existem riscos à espreita com a proliferação do uso da prova de ADN: de um lado, esta é-nos apresentada com qualificativos de objectividade, de neutralidade, de rigor (e a prova de ADN não é absolutamente confiável) ― aconselhando ser instrumento de afrontamento do sentimento individual de insegurança e, portanto, auxiliar valioso na realização da justiça criminal ―, de outro lado, as populações exibem uma franca tolerabilidade à recolha de dados e os Estados propendem para o combate activo e infalível do crime, tendendo a edificar sociedades de dominação do risco, de controlo da perigosidade e da reincidência. Daqui derivam as preocupações manifestadas de eventual desencontro entre a finalidade da pretensão punitiva e o conteúdo protegido pelos direitos fundamentais constitucionais. O Estado tem ao seu dispor dois jeitos de realização da justiça penal: o do funcionalismo, do utilitarismo, do eficientismo e instrumentalidade da pessoa humana ou o do personalismo, a do humanismo e da não coisificação da pessoa humana. Será a recolha coactiva de material biológico expressão de necessidades funcionalistas de um processo penal que pretende solucionar eficientemente um problema ― apurar o autor do crime e o grau da sua responsabilidade? Oferece condições de respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos? É compatível com os limites do poder punitivo estadual? Permite conciliar o interesse da segurança e protecção da sociedade organizada com a consideração devida ao homem individualmente? Quando o corpo humano é fonte de prova, a própria integridade pessoal é atingida, as pesquisas de material genético e no material biológico podem colocar em causa a incolumidade física e moral do visado e a sua liberdade, mais precisamente, o direito à autodeterminação pessoal. É o que acontece justamente com os “exames de ADN” que implicam intervenção no corpo ou sobre o corpo da pessoa. É importante que entendamos até que ponto serão significativas estas ou outras ingerências face às necessidades da justiça penal. Por isso procurámos determinar a intencionalidade que preside a estas recolhas, apurar a sua importância, compreender o seu critério regulativo e descortinar as condições da sua aceitabilidade, demandando uma resposta no sentido de apurar se os meios de obtenção de prova de ADN ― invasivos e não invasivos ― e o instrumento “prova de ADN” constituem intervenções formal e materialmente permitidas ou intervenções formalmente autorizadas mas materialmente arbitrárias. A comunicação entre a Lei Fundamental e a lei ordinária reivindica a utilização de métodos probatórios proporcionais à condição do ser humano, adequados à dignidade da pessoa humana e apropriados a fazer pactuar valores como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da igualdade e da justiça. O indivíduo, enquanto objecto de prova em processo penal, não deixa de ser um sujeito com a sua personalidade, identidade e originalidade, com os seus interesses, com a sua consciência individual. O desafio consiste em não transformá-lo em puro e simples objecto do procedimento criminal. A confiança do povo em nome de quem a justiça é administrada prescreve a não frustração da perseguição penal e a eficiência da administração da justiça penal. Os cidadãos gozam do direito à segurança consignado no art. 27º da Constituição da República Portuguesa. Todavia, a administração da justiça criminal não pode ser irrestrita e ilimitada no que respeita aos fins e aos meios. Nem pode utilizar, ainda que com o desiderato de zelar pela liberdade e bem-estar dos cidadãos, meios de aquisição de prova e meios de prova que, prima facie, constituem limitações à liberdade e à integridade física dos cidadãos. Donde decorrem algumas das nossas interrogações sobre as colheitas de amostras biológicas no corpo e do corpo humano para realização de análises de ADN a fim de identificar o presumível autor do facto criminoso. O jurista há-de desempenhar um papel de relevo pugnando pelo exercício dos direitos, sobretudo no sentido de os aperfeiçoar e de afinar a sua significação, sempre com a devida adaptação ao contexto geral que compreende os factores sociais, económicos, políticos e jurídico. O processo de dinamização societário decide a tolerância de determinadas acções e determina a intolerância de certas condutas até porque o homem é um fazedor do Direito e é por ele condicionado e, por sua vez, o Direito sofre o embate do fenómeno da globalização que é fonte da modelação de uma nova ordem e do estabelecimento de novos equilíbrios. Após uma introdução, fazemos considerações sobre a prova processualmente válida e seu referencial constitucional, seguida de uma parte destinada ao estudo da cientificidade da prova de ADN em processo penal, trazendo à discussão os principais problemas jurídicos e questionando-se a eventual colisão de valores ideais. Sucede-se uma outra parte sobre a necessidade de um espaço de liberdade, segurança e justiça na União Europeia, dando-se particular realce à problemática da transferência de dados pessoais e à transferência de meios de prova e, finalmente, cura-se da necessidade ou desnecessidade de reinterpretação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade no que respeita aos requisitos de admissibilidade dos exames de ADN não consentidos.pt
dc.description.sponsorshipOrientação: Professor Doutor Germano Marques da Silvapt
dc.identifier.citationGuimarães, A.P. (2014). A pessoa como objecto de prova em processo penal: exames, perícias e perfis de ADN - reflexões à luz da dignidade humana. (Tese de Doutoramento), Universidade Portucalense, Portugal. Disponível no Repositório UPT, http://hdl.handle.net/11328/1075pt
dc.identifier.otherCota: TDD 2
dc.identifier.tid101350767
dc.identifier.urihttp://hdl.handle.net/11328/1075
dc.language.isoporpt
dc.publisherUniversidade Portucalensept
dc.rightsembargoed accesspt
dc.subjectExamespt
dc.subjectPeríciaspt
dc.subjectADNpt
dc.subjectBases de dadospt
dc.subjectPerfil de ADNpt
dc.subjectProvapt
dc.subjectMedidas de coacçãopt
dc.subjectPresunção de inocênciapt
dc.subjectDireito ao silênciopt
dc.subjectPrivilégio de não auto-incriminaçãopt
dc.subjectIntegridade pessoalpt
dc.subjectCorpo humanopt
dc.subjectDignidade humanapt
dc.subjectDados pessoaispt
dc.titleA pessoa como objecto de prova em processo penal: exames, perícias e perfis de ADN - reflexões à luz da dignidade humana.pt
dc.typedoctoral thesispt
dspace.entity.typePublicationen
person.affiliation.nameIJP - Instituto Jurídico Portucalense
person.familyNameGuimarães
person.givenNameAna Paula
person.identifier.ciencia-idDF1E-48BE-F547
person.identifier.orcid0000-0002-0813-4789
person.identifier.ridH-1779-2016
person.identifier.scopus-author-id57208149138
relation.isAuthorOfPublication3b104e7a-307c-4844-9f9b-a4332295f7d3
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